Um caminho de pedras à beira do rio. O som dos pássaros na copa da árvore. A água gelada corre a montanha. Os pés da menina descalços na terra. Ela corre, ela ri, ela grita: “Voltaaaaaaaa!” Num grito alado, fôlego de criança.
_ Voltaaaaaaaaaa!
Na casa, as cortinas balançam ao vento. O canto da mãe embala o vazio das horas. Cozinha, de pés descalços, canta…
A menina vai longe sem saber pra onde voar – “Volta! Voltaaaaaaaaa!” – segue o balão de gás vermelho no céu, que vai sangrando, valsando com o vento. Desenhando no espaço a saudade do antes.
A tarde se põe e o negrume da noite invade o casebre detrás do morro. A mãe põe a mesa e a menina vai longe. A mãe sente o coração beliscar. A menina não pode parar. Uma lágrima escorre no rosto pálido da mãe. O espanto surge no canto da boca da menina. A mãe quer gritar “Volta!” A menina calada observa a imagem do homem na pedra.
A comida no prato esfria na mesa. A imagem da mãe pela janela. Nada vê, o corpo estremece, não sai do lugar.
O balão se perde no escuro da noite. A menina abraça a estátua de pedra. Sussurra: Volta! Num sopro infantil. E, então, ela sorri e corre de volta pelo caminho do rio, com os pés descalços na terra, seguindo a trilha de pedras.
A mãe a aperta nos braços, um afago feroz – “Onde estava, menina?”
“Foi meu coração!” – respondeu a menina – “Ele bateu muito longe e eu o segui.”
“Eita, menina, a comida esfriou!”
PS: Texto nascido numa tarde de Histórias Libertas, workshop ministrado por Cláudia Pucci Abrahão, no dia 11.10.14